A gestão por competências se apresenta como o caminho mais curto e eficaz para alinhar as políticas de RH às estratégias de negócios
A idéia de que toda a estrutura organizacional de uma empresa deve ser orientada para responder aos seus objetivos de negócios e gerar valor aos acionistas parece extremamente óbvia. No entanto, a realidade de boa parte das corporações no Brasil e no mundo indica uma imensa dificuldade para efetivar essa obviedade. A dissociação entre as políticas de gestão de pessoas e os demais setores da empresa é um fator que infelizmente marca as relações interdepartamentais nas organizações. A lista de elementos que formam missões, valores e metas de uma empresa parece não fazer sentido quando se observa o grau de comunicação e articulação que vigora entre departamentos como o financeiro e o de recursos humanos.
Muito mais do que uma constatação, essa realidade apresenta aos diretores, presidentes e administradores em geral o grande desafio de integrar todas as esferas de ação sob um mesmo rumo. Trata-se da necessidade urgente de estabelecer uma linguagem única que garanta que todos os esforços da organização sejam canalizados para o real sentido de sua existência.
Num tempo marcado por tantas mudanças econômicas e corporativas, seria natural que os mecanismos relacionados à gestão de pessoas também passassem por transformações estruturais, a fim de permitir seu alinhamento às grandes estratégias de negócios. É nesse contexto que ganham importância conceitos como o de gestão por competências, uma idéia que passou a ser valorizada apenas recentemente no Brasil.
A gestão por competências consiste numa forma de administrar pessoas com o objetivo de gerar as capacidades necessárias para se atingir as metas da organização. É simples na definição e muito complexa na execução. Ela integra todos os sistemas da área de recursos humanos, desde a seleção de profissionais até os mecanismos de viabilização do capital humano, passando por fatores como espaços ocupacionais, avaliação de desempenho, remuneração, treinamento e desenvolvimento. Hoje em dia, é difícil supor que o administrador de uma grande empresa já não tenha definido bem qual é a estratégia de negócios que sua organização visa implantar. O problema, portanto, não está em saber o que deve ser feito, mas em como gerar efetivamente as condições de sua realização. Está aí o papel da gestão por competências.
A consolidação da gestão por competências põe fim ao tempo em que as chamadas políticas de RH poderiam ser encaradas pelos administradores de empresas como um campo fluido, etéreo e praticamente descolado das reais metas da corporação.
A partir de agora, as organizações realmente competitivas serão aquelas que souberem adequar as capacidades de suas equipes e áreas de atuação àquilo que realmente interessa, isto é, os negócios. Numa época em que tanto se fala em metodologias para mensurar os ativos ditos intangíveis, descobre-se, finalmente, que o principal ativo das empresas passou a ser, mais do que os sistemas processuais e as ferramentas tecnológicas, o próprio ser humano, aquele que pensa e faz a empresa acontecer.
Esse novo modo de encarar o funcionamento das empresas leva os administradores a repensar o papel das pessoas no processo de trabalho, as quais deixam de ser consideradas um fator perecível em si e, de certa forma, substituível com facilidade. A gestão por competências busca fazer com que cada funcionário cumpra seu papel em favor da estratégia geral da empresa, a partir de conhecimentos, habilidades e atitudes próprios. Além da identificação e do desenvolvimento de capacidades, essa proposta envolve a integração dos diversos tipos de competências, conforme o perfil de cada funcionário, e a implementação de novos padrões, que vão do recrutamento à remuneração. Neste último ponto, ela estabelece que cada funcionário vale não mais pelo cargo que ocupa, mas pelo quanto seu trabalho efetivamente representa para que a organização alcance seus resultados. De maneira geral, pela gestão por competências, todos os sistemas e as diretrizes da administração de pessoas seguem uma lógica única, que visa a melhor formação dos profissionais e sua preparação para atender às demandas de negócios, gerando valor concreto à empresa e aos acionistas.
Entre as características que marcam a administração do capital humano pela gestão por competências, estão: alta flexibilidade, agilidade, comunicação ampla, trabalho em equipe, eficácia e eficiência nas operações, equilíbrio entre resultados, inovação e visão completa do sistema. Sua implantação facilita o entendimento, a organização e a disseminação dos conhecimentos e estimula a integração entre os setores da estrutura, possibilitando a quebra de obstáculos que atravancam a fluidez operacional das equipes. Além disso, esse método representa um meio de comunicação das mensagens-chave de atitudes, conhecimentos e habilidades esperadas de cada membro da equipe, promovendo também total transparência em relação aos critérios para o desenvolvimento profissional.
Ainda que incipiente nessa prática, o Brasil já tem casos de sucesso na implantação de um sistema de gestão por competências. Entre eles, cabe destaque a experiência do Sebrae (Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas), instituição reconhecida nacionalmente pela sua eficácia na formulação e articulação de soluções e geração de negócios. A partir de 2002, o Sebrae buscou implementar um programa de reestruturação completa de seu quadro de colaboradores, com a redefinição das ocupações, das exigências de qualificação, dos critérios de avaliação e das diretrizes para a evolução das carreiras. Foram estabelecidas também novas políticas de remuneração, de acordo com os diferentes níveis de competências, e constituídos núcleos de acompanhamento e avaliação de resultados. Essa transformação radical na sua política de capital humano foi certamente um dos fatores fundamentais para que o Sebrae consolidasse seu grau de credibilidade e profissionalismo singulares no mercado.
No conjunto, as ações que propõem uma gestão por competências revolucionam os tradicionais sistemas de recursos humanos vigentes no mercado de trabalho, propondo às organizações de todo o mundo uma nova forma de operar e buscar seus objetivos. Nesse processo, o ser humano constitui o elemento-chave das corporações, capaz de integrar e operar, com progressiva proficiência, as competências mais desafiadoras do ambiente empresarial.
Vicente Picarelli Filho
Fonte: www.deloitte.com
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